O efeito borboleta

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“O bater das asas de uma simples borboleta pode influenciar o curso natural das coisas e, assim, provocar um tufão do outro lado do mundo”

Quando eu era adolescente, recordo-me de devorar todo o tipo de livros a que deitava as mãos. Nessa altura, meus pais — zelosos do meu bem-estar físico e intelectual — proibiam-me de ver TV a partir das 21 horas com a desculpa de que: “Amanhã, tens de acordar bem cedo para ir às aulas”. Assim sendo, e como não tinha nem aparelhagem de som nem leitor de videocassetes. Sim! Pasmem os mais jovens que não sabem do que falo, mas nessa altura a época era mesmo analógica. Restava-me o consolo de me despedir da família e ir dormir cedo. Deitava-me, fizesse frio ou calor, com uma lanterna acesa e um livro aberto. Algo que seguramente, hoje, será uma imagem quase tão extinta como os dodôs nas Maurícias.

Um dia houve em que escolhi um livro de bolso de ficção científica, cujo título a borracha da minha memória já apagou faz tempo, e que descrevia uma história em torno de um fenómeno, que tanto irá existir no futuro, como já se manifesta nos dias de hoje: o ‘efeito borboleta’ ou o butterfly effect.

O enredo era simples. Um aventureiro desafiava a sua vida para fazer uma regressão a um passado muito longínquo com a ambição de viajar no tempo. Ora bem, o dito cujo sonhador deu um quantum leap, algures entre o ano 2090 e a génese da civilização do planeta Terra. A ideia que tenho era a de que ele tinha de percorrer um caminho através de uma floresta luxuriante, sem nunca e sob circunstância alguma, pisar uma planta ou ferir ao de leve um animal. E tudo porquê? Porque ao fazê-lo, iria mudar todo o seu curso de vida, já para não falar no curso dos comuns mortais como nós, que apenas podemos viajar de carro, comboio ou avião.

A imagem ilustra bem o que é o ‘efeito borboleta’ a outros níveis de entendimento mais mundanos. Isto porque, no fundo, não passamos de marionetes num grande teatro, cujo realizador nem sempre sabemos quem é.

Vamos desmistificar.

Algures no nosso planeta, um senhor chamado Putin declarou guerra aberta à Ucrânia, e nesta geografia distante — que é a nossa — acabamos sofrendo todos com a sua decisão. Detalhes à parte sobre uma eventual disputa territorial ou económica que justifique a extensão do estrago feito, o que me perturba é o resultado que o seu delírio provoca em pessoas que nem sabem que ele ou o seu país existem no mapa.

No outro dia, tive de explicar à minha empregada por que razão o combustível e os bens de primeira necessidade estavam a aumentar escandalosamente de preço. Não lhe cabe na cabeça porque é que tem de pagar muito mais por um saco de batatas ou de arroz e porque é que o seu salário já não é suficiente para fazer o rancho do mês e enviar ajuda para as suas filhas que residem na Beira.

O ‘efeito borboleta’ leva a que apertemos o cinto ou a que aumentemos os salários? Mas como podemos aumentar os salários num clima de crise em que o capital não circula, em que os pagamentos tardam e falham, e num país onde a inclusão financeira ainda é um cavalo de batalha.

Os dados foram jogados. Se antes fomos abalados pela pandemia da Covid-19, e antes disso fomos atingidos pela inércia económica fomentada pelas “Dívidas Ocultas”. Agora, vivemos num clima de insegurança porque dependemos do resto do mundo em termos de indústria, agricultura e energia, para viver com alguma dignidade ou qualidade de vida. Vivemos a olhar para cima com receio que alguém nos pise. Tudo porque neste canto do mundo estamos sujeitos a uma visita inesperada, feita por um intrépido aventureiro que viaja no espaço à procura de um melhor passado.

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